terça-feira, 3 de junho de 2008

Farsas e desumanidades


por Wálter Fanganiello Maierovitch

Uma amizade desinteressada sempre comove. Nesta semana, esse sentimento foi seguramente experimentado por quantos acompanharam o relato do americano Morris Talansky, de 75 anos. Um testemunho de oito horas, prestado em inglês e na cidade de Jerusalém, a juízes israelenses de instrução.

Talansky, megaempresário americano, é amigo fraterno do premier israelense Ehud Olmert. Desde quando Olmert foi prefeito de Jerusalém.

Nos tempos de prefeitura e de Ministério da Indústria, Talansky enviou generosos envelopes recheados de dólares para Olmert. Pelos seus cálculos, remeteu 150 milhões de dólares em 15 anos e, ressaltou, jamais haver colocado num envelope quantias superiores a 8 mil dólares.


Segundo frisou aos juízes, nunca pediu nada em troca e de Olmert não recebeu favores. Ao contrário. Revelou Talansky que, certa vez, quando interessado em promover a sua empresa, Olmert forneceu-lhe, para ajudar, telefones de três homens de negócios nos EUA, todos hebreus. Um deles, único contatado, soltou-lhe os cachorros e avisou-lhe para não procurar políticos para tratar de negócios.

Fora o doado por cédulas de dólares em envelopes, o amigo fez alguns empréstimos a Olmert, ainda não honrados. Por exemplo: numa viagem de férias à Itália, Olmert obteve de Talansky cerca de 30 milhões de dólares. Quando o cartão de crédito de Olmert foi recusado num terminal de saque em Washington, o amigo usou o seu dinheiro plástico e pagou 4,7 mil dólares de diárias de hospedagem no Ritz-Carlton Hotel.

Para o advogado do premier, Navot Tel-Zur, o relato de Talansky, que voou a Jerusalém para atender ao chamado da Justiça, sepulta insinuações a respeito de corrupção.
O causídico sustenta que a “grana envelopada” era usada em campanhas políticas, licitamente. Uma ajuda a um político brilhante, que serviria a Israel. No particular, Navot recordou uma frase de Talansky: “Tinha por ele grande admiração e o chamava de príncipe do Likud. Era o líder que eu desejava ser, caso tivesse talento”.

Até agora, os juízes de instrução apenas realizam apurações, ou seja, não iniciaram nenhum processo criminal contra Olmert. Por evidente, nem a mais ingênua das velhas “mama-iídiche” acreditaria na capacidade de um filho seu para obter tamanhas generosidades.

Fama de corrupto, de incompetente e de fâmulo do presidente Bush, o premier Olmert consegue, embora enfraquecido, sobreviver politicamente. Em especial depois de a sua responsabilidade ter sido, em processo administrativo, compartilhada com os militares pela desmoralizante derrota imposta a Israel pelo Hezbollah, na guerra do Sul do Líbano, em 2006.

Enquanto Talansky prestava depoimento, Olmert, para passar a imagem de tranqüilidade, visitava uma base da Marinha. Para a oposição, faz parte de mero diversionismo de Olmert, também, os entendimentos reabertos, por intermédio de Ancara, com a Síria. Primeiro, porque Bush não quer acordos de paz no Oriente com o envolvimento de Síria e Irã. O segundo ponto é que um premier do tipo de Olmert não decide contra a vontade dos israelenses, cuja esmagadora maioria, conforme recente pesquisa e não contadas opiniões dos assentados, não quer a devolução das Colinas de Golã à Síria.

Embora o relato de Talansky tenha sido do agrado do advogado de Olmert, a situação ainda é de risco. Isso porque não foi ouvida Shula Zaken, a secretária que acompanha Olmert desde a prefeitura e que, segundo Talansky, recebia os envelopes e dava destinação ao dinheiro.

Enquanto Talansky se mostra generoso, o general birmaniano Than Shwe, que cobriu sua filha de diamantes raros nas bodas nupciais, continua a dar uma banana à comunidade internacional e, por meio de uma junta de militares, despreza os mais elementares direitos do seu povo.

O ciclone Nargis varreu a Birmânia em maio e, além de 78 mil mortos, deixou sem abrigo mais de 50 mil cidadãos. A junta militar, que construiu a cidade de Naypyidaw para servir de capital e deixar os generais distantes dos protestos da população rangoon, embaraçou ao máximo o desembarque de auxílio humanitário enviado por diferentes e solidários países.

Quando deliberou pela aceitação do auxílio de alimentos, medicamentos e roupas, a junta avisou que voluntários estrangeiros, da área médico-sanitária, não poderiam entrar no país. Médicos da Índia e da Tailândia foram barrados na fronteira.

Para rematar, na terça-feira 27 de maio, a junta presidida pelo general-ditador Than Shwe prorrogou por seis meses a prisão domiciliar de Aung San Suu Kyi, ganhadora do Nobel da Paz, em 1991. Seu crime foi ter ganho, de lavada embora sem levar, as eleições de 2000.

Desde que voltou do exílio, há 18 anos, Aung já passou 12 anos presa por ordem dos generais ditadores da Birmânia, que rebatizaram com o nome de Mianmar.

Fonte: Carta Capital
Share/Save/Bookmark

Nenhum comentário: