Marina: "MP 450/08, que voltou à Câmara dos Deputados, guarda um grande potencial de problemas e agressões ambientais"
por Marina Silva
De Brasília (DF)
Pode não parecer, mas estamos em plena Semana Nacional do Meio Ambiente. Criada por um decreto em 1981, ela acontece sempre no início deste mês e se soma às comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente, no dia 5 de junho. A data foi instituída em 1972, pela Conferência de Estocolmo, na Suécia, que reuniu 115 países das Nações Unidas em torno das questões ambientais. Foi a partir daí que o movimento ambiental ganhou força no mundo.
Naquela época, o Brasil buscava o desenvolvimento a qualquer custo. Vivíamos em plena ditadura militar e a Amazônia era apenas uma terra a ser ocupada, um inimigo a ser domado. Ainda hoje a floresta guarda as feridas dos megaprojetos fracassados.
Com a democratização do país e a pressão dos movimentos sociais, dos ambientalistas, do mundo acadêmico e da própria população, lentamente uma série de leis e medidas foram sendo tomadas para evitar danos graves e muitas vezes irreparáveis ao meio ambiente.
Desde a Constituição de 1988, especificamente o artigo 225 - que afirma que todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, cabendo a todos e ao Poder Público o dever de preservá-lo e defendê-lo para as presentes e futuras gerações -, o Brasil foi aprimorando seu arcabouço jurídico, a ponto de a sua legislação ambiental passar a ser considerada uma da mais avançadas do mundo.
Nos últimos anos, o panorama ambiental brasileiro passou por dois movimentos fortes. O primeiro, uma inflexão no rumo das premissas do Desenvolvimento Sustentável, envolveu uma série de mudanças metodológicas, legislativas e políticas.
Os resultados foram bons e animadores: redução de 59% da taxa de desmatamento na Amazônia em três anos e criação de 24 milhões de hectares de novas unidades de conservação. Além disso, foram alcançadas conquistas inéditas, a exemplo da resolução do Conselho Monetário Nacional, que vinculou o crédito agropecuário à comprovação da regularidade ambiental e fundiária.
Infelizmente, o segundo movimento, ora em curso, é totalmente contraditório com essa inflexão positiva. Em plena Semana Nacional do Meio Ambiente corremos o risco de ver o Senado Federal aprovar a Medida Provisória (MP) 458/09, que terá como efeito perverso a institucionalização da grilagem de terras na Amazônia. A proposta abre, literalmente, a porta para regularizar, titular e privatizar 67 milhões de hectares de terras públicas na Amazônia, um total equivalente aos estados de Minas Gerais e de Santa Catarina.
São sucessivos ataques que, partidos de setores do empresariado e do próprio governo, tentam desconstituir a legislação ambiental brasileira e a Política Nacional de Meio Ambiente.
Outro exemplo é a MP 452/08, que pode cair nesta semana, pelo impasse criado no Senado. Ela inclui o fim do licenciamento ambiental em obras de recuperação de estradas, o que é um golpe contra a floresta amazônica. A MP 450/08, que voltou à Câmara dos Deputados, guarda um grande potencial de problemas e agressões ambientais. Em seu artigo 17, cria uma nova categoria de usinas hidráulicas, entre 30MW e 50MW, que terão rito sumário de autorização e sem as características de pequenas centrais hidrelétricas, ou seja, sem limites para o tamanho do lago.
A sociedade brasileira demonstra amplo apoio às causas ambientais. Mas, no Congresso e mesmo no governo, volta a aparecer com força a idéia de que a legislação que protege o que nos restou das florestas e da nossa biodiversidade é a maior inimiga do desenvolvimento e da agricultura no Brasil. É a velha e ultrapassada concepção que contrapõe as atividades econômicas à proteção do meio ambiente. Em nome de um crescimento econômico imediatista e precário, sacrificam-se nossos maiores ativos, que são justamente os recursos ambientais. Nada mais antieconômico.
Por isso, esta Semana do Meio Ambiente é marcada pela preocupação e por um desafio inequívoco: o de defender nossas conquistas porque o mundo mudou, o Brasil mudou e não podemos retroceder em nossos passos. Não podemos retornar ao século XX, o século XXI nos exige andar para frente. E à frente está o cerne desse desafio, que é fazer a síntese entre justiça social, economia sustentável e uma relação respeitosa com o meio ambiente.
Fale com Marina Silva: marina.silva08@terra.com.br
Fonte: Terra Magazine
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