segunda-feira, 1 de junho de 2009

Greenpeace: governo é sócio de corporações que devastam a Amazônia

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Gado na Amazônia

Gado na Amazônia

por Altino Machado

A organização não-governamental Greenpeace divulga nesta segunda-feira o relatório inédito “Abatendo a Amazônia”, de 140 páginas ou 63,2 MB (aqui, em inglês), em que acusa o governo brasileiro de financiar e ser acionista das maiores empresas do setor pecuário que operam na Amazônia, apresentadas como o maior vetor de desmatamento do mundo. Marcas famosas do setor de calçados, cadeias de supermercados, produtos de higiene pessoal e grifes de luxo também são acusadas de impulsionarem a devastação da região.

O governo brasileiro é criticado por possuir US$ 2,65 bilhões em ações de empresas frigoríficas, que se beneficiam do abastecimento barato de gado criado em áreas da Amazônia destruídas ilegalmente. A projeção do Greenpeace é de crescimento para as exportações nas próximas décadas, o que deverá aumentar a pressão sobre as florestas da Amazônia.

- Além disso, propostas de mudanças na legislação ambiental, em tramitação no Congresso Nacional, pretendem legalizar a grilagem e aumentar a área de floresta que pode ser desmatada legalmente em propriedade privada na Amazônia. Em vez de reduzir a destruição florestal, essas medidas devem levar a um aumento do desmatamento - afirma.

De acordo com a ONG, de 2007 a 2009, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) liberou créditos de US$ 2,65 bilhões para pecuaristas, que seriam responsáveis por 80% da devastação da floresta, ajudando a alimentar uma cadeia de indústrias que impulsionam a destruição. Entre 2008 e 2009, o Plano Agrícola e Pecuário 2008/09 liberou US$ 41 bilhões em linhas de crédito para aumentar a produção do setor agropecuário, 85% delas para agricultura industrial.

- O retrato devastador da destruição Amazônia delineado neste relatório é apenas uma das trágicas realidades que as florestas enfrentam todos os dias. A indústria da pecuária na região é o maior vetor de desmatamento do mundo, mas outros vetores em outras regiões do planeta também devem ser combatidos - assinala o Greenpeace.

O setor pecuário na Amazônia brasileira responde por 14% do desmatamento global anual. Os três frigoríficos que receberam a maior parte do investimento público foram: Bertin, uma das maiores comercializadoras de couro do mundo; JBS, empresa que controla pelo menos 10% da produção global de carne, e Marfrig, a quarta maior comercializadora mundial de carne.

- A expansão destes grupos é, efetivamente, um empreendimento conjunto (joint-venture) com o governo brasileiro. Estas empresas vêem a crise financeira como uma oportunidade para aumentar sua participação no mercado global. Sem o dinheiro do governo brasileiro, sua habilidade de continuar construindo um império comercial global, voltado para a exportação de produtos pecuários da Amazônia, poderia ter sido reduzida - afirma o Greenpeace.

Segundo a ONG, para reforçar a participação brasileira no mercado global, o governo está disponibilizando recursos para expandir a infra-estrutura de processamento de produtos pecuários na região Amazônica.

A parceria entre o governo brasileiro e a indústria da pecuária comercializa trabalho escravo e desmatamento, sustenta o Greenpeace. Marcas reconhecidas mundialmente geralmente acreditam que a Amazônia está excluída de seus produtos.

Marcas globais

O Greenpeace expõe, pela primeira vez, como o consumo cego de matéria-prima está alimentando o desmatamento e as mudanças climáticas. A ONG revela a complexa teia do comércio global de produtos bovinos envolvendo os frigoríficos brasileiros Bertin, JBS e Marfrig. Foram identificados centenas de fazendas no bioma Amazônia fornecendo gado para seus frigoríficos na região.

Segundo o reltório, todas as vezes em que foi possível obter os mapas das propriedades, análises de satélite revelaram que fornecimento significativo de gado vinha de fazendas envolvidas em desmatamento recente e ilegal. Dados comerciais também mostraram negócios com fazendas envolvidas em trabalho escravo. Além disso, um frigorífico da Bertin recebeu gado de uma fazenda instalada ilegalmente dentro de uma Terra Indígena.

- Nossas evidências ligam a cadeia contaminada de produtos amazônicos aos fornecedores de muitas marcas reconhecidas mundialmente, incluindo uma longa lista das chamadas empresas ‘Blue Chip’ (‘ações de primeira linha’): Adidas, BMW, Carrefour, EuroStar, Ford, Honda, Gucci, IKEA, Kraft, Nike, Tesco, Toyota, Wal-Mart. O setor público também está envolvido: nossas descobertas ligam a cadeia contaminada a fornecedores do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS) e a fornecedores no Oriente Médio, cujos clientes incluem as forças militares britânica, holandesa, italiana, espanhola e norte-americana.

Antes de exportar, os frigoríficos da região Amazônica embarcam carne ou pele para fábricas processadoras a milhares de quilômetros de distância no sul do país. Em diversos casos, processamento adicional é realizado nos países importadores antes que o produto final chegue ao mercado. De fato, o abastecimento ilegal ou criminoso de gado é “lavado” ao longo da cadeia até chegar ao mercado global involuntário.

Tour du Monde

 Fazenda Santa Amália em Tangará da Serra MT)

Fazenda Santa Amália em Tangará da Serra MT)

O Greenpeace afirma que os produtos bovinos da Amazônia dão a volta ao mundo de 80 maneiras. A ONG fez investigações sigilosas sobre como isso acontece:

China: Globalmente, cerca de metade da produção de couro é destinada a sapatos. A China é o maior produtor e exportador de sapatos do planeta, responsável por cerca de 60% do volume total mundial em 2006. A Bertin é a maior exportadora de couro para a China. Investigações do Greenpeace revelam que fabricantes de tênis da Nike e Adidas/Reebox usam couro acabado de compradores diretos da Bertin

EUA: A segunda maior utilização do couro se dá na fabricação de móveis e estofamento para automóveis. A produção de couro para interiores de veículos é terceirizada para empresas processadoras, como a norte-americana Eagle Ottawa, que consome 20% do couro comercializado no mercado global para estofamentos de veículos. A Bertin é fornecedora exclusiva da Eagle Ottawa, que absorve 30% das suas exportações de couro. A Eagle Ottawa fornece para a BMW, Ford, Honda, Toyota e muitas outra

Itália: A Itália é o segundo maior exportador mundial, em valor, de sapatos de couro e um importante centro de produção de couro de alta qualidade para o mercado da moda. As bolsas ocupam lugar de destaque na indústria italiana de exportação, responsável por quase dois terços do comércio de produtos de couro do país. Os dois maiores processadores italianos de couro, o Rino Mastrotto Group (RMG) e o Gruppo Mastrotto (GM), recebem fornecimentos regulares de couro da Bertin. Os dois grupos processadores fornecem matéria-prima para Boss, Geox, Gucci, Hilfiger, Louis Vuitton e Prada.

A JBS possui 50% da divisão de produção de carne e subprodutos do Gruppo Cremonini. Entre seus clientes, o Gruppo Cremonini é fornecedor exclusivo da empresa ferroviária Italian Railway (Trenitalia, EuroStar Group, Cisalpino AG) e fornece também parra as empresas ferroviárias francesas SNCF e Thalys International. A JBS e Marfrig fornecem para o Gruppo Cremonini na Itália JBS and Marfrig supply Cremonini in Italy.

Reino Unido: O mercado de lojas de conveniência e a indústria de serviços de alimentos estão mudando o que comemos, onde comemos e onde compramos. O mercado inglês de comidas prontas é ‘o mais avançado da Europa’. ‘As vendas de refeições prontas, tanto congeladas quanto refrigeradas, representam 7% de todas as refeições do Reino Unido. O país importa 40% de sua carne processada (pronta, cozida ou enlatada) do Brasil. Quase 90% deste total vem da Bertin, JBS ou Marfrig.

Brasil: o Brasil é um mercado emergente. De acordo com multinacional Unilever, ‘O poder do consumidor está crescendo mais rapidamente em mercados [em desenvolvimento e emergentes] do que em mercados desenvolvidos.

No Brasil, três gigantes da indústria de supermercados – Carrefour, Wal-mart e Grupo Pão de Açúcar (afiliada ao Grupo Casino, da França) – controlam quase 40% do setor. A Bertin, JBS e Marfrig fornecem diversos produtos frescos e processados para o Brasil e outros mercados emergentes.

Fotos: Greenpeace/Divulgação

Fonte: Blog da Amazônia - Terra Magazine

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