quinta-feira, 9 de abril de 2009

Não é hora de ser bonzinho

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Orgulhe-se do seu prestígio, presidente Lula, mas se o dinheiro está sobrando invista-o aqui mesmo no Brasil

por Alon Feuerwerker


A reunião do G20 em Londres teve um resultado prático. Os países parecem ter concordado em fazer uma caixinha para reforçar o Fundo Monetário Internacional (FMI), e assim capacitá-lo a intervir nas nações mais sujeitas à bancarrota. No mais, o convescote londrino produziu as costumeiras declarações de intenção. Na vida real, por outro lado, os Estados Unidos rechaçaram a ideia de entregar o comando de sua economia a um hipotético órgão de governança global. E pouquíssimo foi feito de concreto contra o protecionismo.

Olhe-se o retrato oficial do encontro e observar-se-á um plantel de líderes impopulares, ou em grave risco de impopularidade. As notáveis exceções talvez sejam Barack Obama e Luiz Inácio Lula da Silva. O americano é 100% inocente, não tem qualquer culpa no desastre econômico-financeiro global. Aliás, elegeu-se derrotando os que provocaram o tsunami. Já os demais, de um jeito ou de outro, andaram surfando na “exuberância irracional”, termo que leva mais de uma década mas que só agora parece ter adquirido o completo significado.

Então, todos precisam dar a impressão de que estão fazendo algo. A coisa não anda fácil para ninguém. O anfitrião do conclave dos salvadores do planeta, o premiê trabalhista Gordon Brown, até ganhou certo fôlego na passagem do ano, ao sair na frente e defender a intervenção estatal nos bancos. Mas o tempo passou e ele voltou a cair nas pesquisas. Está, como é seu hábito desde que substituiu Tony Blair, comendo poeira atrás dos conservadores.

O presidente da França, Nicolas Sarkozy, também desce a ladeira. Os levantamentos de opinião pública mostram que engorda a cada dia o já amplamente majoritário contingente que desaprova o governo dele. Os franceses, assim como os britânicos, pedem mais ação e menos conversa fiada. O problema é não haver dinheiro suficiente. Por quê? Porque a bonança pré-crise se devia em boa parte a uma riqueza fictícia, parida pelos (e para os) gênios do mercado financeiro. Aquele mundo não volta mais. E não é fácil para ninguém aceitar a ideia de estar mais pobre. E de que só será possível sair da situação com trabalho, muito trabalho.

Mas voltemos a Londres. Parece que agora os brasileiros vamos enfiar a mão no bolso para ajudar o FMI. Não há dúvida de que no plano simbólico é uma vitória e tanto para Luiz Inácio Lula da Silva. Um país que vivia de pires na mão a cada crise hoje é chamado a ajudar a enfrentar a tempestade financeira. Parabéns, presidente Lula. Dito isso, talvez seja o caso de questionar se, para além do orgulho e da satisfação pelo prestígio, haverá algum motivo adicional que nos leve a apertar ainda mais o cinto e ajudar a pagar a conta de uma crise criada pelos outros.

O Brasil não quebrou, é verdade, mas nossos números pedem cuidado. A curva das receitas públicas segue para baixo, enquanto a das despesas está, numa visão benigna, engessada. A balança comercial mal e mal se mantém num patamar medíocre, graças principalmente à queda das importações. Não que elas estejam sendo substituídas por produto nacional. É que a economia está atolada. Pior ainda, somos um país que não imprime moeda forte (por razões óbvias), nem se arrisca a fazer mais dívida (por falta de vontade política dos nossos governantes).

Quem deve pagar a conta da crise? Quem deve socorrer as nações falimentares, que acreditaram no “Fim da História” e abriram enlouquecidamente suas economias? Ora, quem imprime moeda forte e está disposto a se endividar. Você sabe de quem estou falando. Orgulhe-se do seu prestígio, presidente Lula, mas se o dinheiro está sobrando invista-o aqui mesmo no Brasil. E deixe que os Estados Unidos e a Europa, mais precisamente a Alemanha, absorvam o custo de suas aventuras imperiais das duas últimas décadas. Não foram eles que prometeram o paraíso da “globalização” ao Leste Europeu? Então que se virem para dar um jeito na situação.

Não é hora de ser bonzinho. Nenhuma potência, das dignas do nome, está sendo.

Coluna (Nas entrelinhas publicada no Correio Braziliense)

Fonte: Blog do
Alon Feuerwerker

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