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por Luis Nassif
Há uma guerra declarada do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes contra Ministério Público, Polícia Federal e juízes de primeira. Não se tente personalizar o conflito. Ele tem implicações muito mais profundas, é reflexo de um dos fenômenos mais importantes dos últimos tempos: a mudança total de paradigmas no sistema de informações do país, obrigando a uma mudança completa em hábitos políticos e empresariais consolidados.
No meu livro “Os Cabeças de Planilha”, procuro traçar paralelo entre as primeiras décadas do século e as últimas. Primeiro, a República, coincidindo com um período de esbornia financeira global.
Os chamados financistas controlam a política econômica, garantem a política de governadores - com práticas cada vez mais corruptas - ao mesmo tempo em que emerge uma nova sociedade urbana e eclodem revoltas a partir das bases do Exército - os tenentes. Essas mudanças são aceleradas pelas novas mídias - na época, o rádio, que permite a explosão da informação e da cultura urbana brasileira.
Agora se tem a volta do pêndulo repetindo o ciclo. Primeiro a esbórnia dos primeiros anos de redemocratização. Depois, a financeirização absurda, que permitiu que sistemas de crime organizado participassem dos esquemas de poder.
A cada dia que passa, mais bancos de dados são disponibilizados para consulta pública, mais jornais, mais arquivos, mais blogs, em um processo irreversível de transparência.
Por exemplo, a operação Castelos de Areia revelou o nome de um lobista que intermediava as doações políticas da empreiteira. Uma breve consulta ao Google revelou que era filho de um Ministro do Tribunal de Contas da União.
Um leitor do Blog identificou uma reportagem de uma revista semanal, de 1996, levantando acusações contra o Ministro, na época candidato a governador do Distrito Federal. Depois, outro leitor informou que, depois que se tornou Ministro, dois irmãos passaram a patrocinar causas no TCU. Uma breve pesquisa nos arquivos do TCU comprovou a afirmação.
Outra pesquisa mostrou que o Ministro é relator de processos envolvendo a empreiteira. Depois, será possível obter mais dados consultando os bancos de dados legislativos, dos tribunais de primeira e segunda instância, das revistas, sites e blogs.
Essa lufada de ar fresco e de informação está mudando o Brasil. Tenta-se disfarçar, criando escândalos em cima da empregada do deputado, da assessora do senador. São as pequenas mazelas que acabam recebendo mais destaque que os grandes esquemas criminosos. Passam a sensação de que se está denunciando a corrupção, enquanto se tenta esconder a grande corrupção debaixo do tapete.
É esse processo de transformações que está trazendo de volta o fenômeno do tenentismo. Não mais oficiais do Exército tentando derrubar o poder, mas policiais, procuradores, juízes, jornalistas independentes tentando impor o primado da lei, enquanto tribunais superiores - e o presidente do Supremo - tentam conter a onda moralizante.
Não tem volta. Apesar das invectivas de Gilmar Mendes, não tem como tapar a peneira. É o mesmo que pretender parar o tempo e o avanço da civilização.
Fonte: Luis Nassif Online
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