quinta-feira, 2 de abril de 2009

A moda é ser pobre, local e austero

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por
Luiz Carlos Azenha

É incrível o que faz uma crise econômica com a conjuntura política mundial. De repente os destinos do planeta não são mais discutidos no G-7, mas no G-20. Sentam o presidente brasileiro ao lado da anfitriã e bem em frente ao Barack Obama. E Lula é bajulado como "o cara", no dizer do presidente dos Estados Unidos.

Há de se admitir que o discurso de Lula -- que pode ser do Itamaraty, tanto faz -- saiu vencedor. A saída para a crise econômica não deve ser encontrada pelos economistas, mas pelos políticos. Os líderes dos países ricos estão se tornando impopulares velozmente, depois de terem patrocinado o salvamento do sistema financeiro com dinheiro público. A moda agora é ser pobre, local e austero.

Austero por razões óbvias. Numa conjuntura de crise, ninguém quer aparecer desperdiçando dinheiro público. Tasso Jereissati será castigado por gastar 500 mil reais do Senado fretando aviões. É o acessório. Tudo bem, ajuda a demonstrar a hipocrisia de alguns. Mas não toca no essencial.

O essencial é preservar o BNDES como uma espécie de "ama de leite" dos falidos.

O essencial é não atacar a incrível concentração de terras nas mãos de alguns. Fiz uma viagem recente ao Mato Grosso. Quilômetros e quilômetros de propriedades gigantes e vazias. Muito gado, nenhum funcionário. Um choque para quem esteve recentemente no Vietnã, onde toda família tem um lote de terra e produz nela.

O essencial é que a renda das riquezas minerais fique nas mãos de alguns grupos econômicos. Que os "projetos de desenvolvimento" sirvam essencialmente às mineradoras muito mais do que às populações locais. Que a infraestrutura de transporte seja pensada para transportar mercadoria, não gente.

A moda é ser "local" porque a globalização, para todos os efeitos, acabou. Não há recuo possível. Mas não há mais como avançar no modelo anterior, que pregava a privatização de todos os bens públicos e a socialização de todos os prejuízos. Esse modelo está falido. E só não haverá uma catástrofe política, dado o potencial de instabilidade gerada pela crise, se o peso dela não ficar nos ombros apenas de quem trabalha e produz. Os "homens" agora precisam do discurso conciliador do presidente Lula.

E, por isso, a moda é "ser pobre". Faz bem, em uma conjuntura política dessas, ter na biografia uma família pobre, uma origem humilde, a experiência pessoal de ter enfrentado dificuldades.

Vivemos um momento extraordinário, de mudanças extraordinárias. O celular, a internet e as antenas parabólicas trouxeram para o mundo do consumo e da cidadania, ainda que estropiada, milhões de novos atores, em todos os continentes. Que crédito seja dado à globalização, quando merece. Agora, com a crise, haverá uma freada brusca. Não só no chamado primeiro mundo, mas principalmente na África e na Ásia. O potencial para distúrbios, quebra-quebras e derrubada de governos é enorme.

O banqueiro de Wall Street que perdeu o bônus não perdeu a casa, nem o iate. Vá explicar isso ao cara que perdeu o emprego em Bangladesh, que perdeu a mistura em Nairobi ou deixou de casar na Jordânia por não poder pagar o dote. Notem só como, de repente, ser "frugal" vai virar moda no Higienópolis, na Barra da Tijuca e nos Hamptons.

Fonte: Vi o Mundo

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