sexta-feira, 17 de abril de 2009

‘Banqueiros, usineiros e empreiteiros’ permanecem como prioridades na agenda para 2010

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por Guilherme C. Delgado

Há forte evidência na agenda de Medidas Provisórias e outras iniciativas do Executivo no Congresso, ou ainda na ação autônoma do governo federal, de que o desenho estratégico que continua a orientar o governo Lula em 2009, preparando a sucessão de 2010, pauta-se pela mesma aliança de economia política do início do governo. "Banqueiros, usineiros e empreiteiros", nesta ordem, como protagonistas invisíveis dos poderes da República, na feliz expressão do amigo há pouco falecido Tamás Szmrecsanyi.

Essa aliança perseguiu, ainda que com defasagens e retardos, a inserção da economia brasileira no "boom" do crescimento da economia mundial, pela via do setor primário exportador.

Do primeiro para o segundo mandato do presidente a tônica de prioridades vai se deslocando do sistema financeiro, para também arranjar espaços ao agronegócio e aos investimentos em infraestrutura de energia (prioridade do PAC). Mas esse movimento sempre se fez preservando uma máxima "renda mínima" aos credores da dívida pública brasileira – prioridade que restringiu o crescimento econômico a níveis bastante aquém do seu potencial de expansão.

Por outro lado, a partir de setembro de 2008 está claramente configurada uma crise financeira externa cuja projeção sobre o Brasil afeta diretamente as principais cadeias agroexportadoras, o programa energético e também o sistema financeiro. Este impacto, por seu turno, é relativamente mitigado, em razão da existência de instituições do Estado do bem estar, como os sistemas de Seguridade Social e Educação Básica, que exercem de fato o papel contra-cíclico.

Com ou sem crise externa era e é evidente que essa estratégia não daria conta de inserir 100 milhões de brasileiros (tamanho atual da População Economicamente Ativa, que ainda cresce ao ritmo de 2,5% ao ano); nem tampouco atenderia às legítimas demandas por direitos sociais dessa população. Tampouco essa aliança e sua forma de estruturação agrária e ambiental são compatíveis com os necessários padrões de manejo sustentável dos recursos naturais no Brasil e no mundo – condição de possibilidade para certos equilíbrios planetários, que mais dia menos dia irão se impondo no lugar da globalização financeira.

Todo esse arrazoado tem a ver com a introdução deste artigo no seguinte aspecto: a pauta de medidas prioritárias do governo no Congresso opera com o foco voltado a retrovisores. Para citar apenas duas medidas legislativas: MP 458 (permite a alienação de terras públicas na Amazônia Legal, sem licitação, com até 10 módulos fiscais; e direitos de preferência para áreas maiores); e a Reforma Tributária Oficial (PEC 233/2008).

O primeiro retrovisor é o foco de crescimento apoiado no padrão primário-exportador. Este, além dos seus notórios limites internos, ignora a crise externa e seu efeito desarticulador sobre as cadeias agroexportadoras de commodities. A MP 458, concebida segundo este viés, estaria legitimando ações promovidas pela banda podre do agronegócio – os grileiros da Amazônia Legal. O pressuposto implícito é de legalizar e não penalizar práticas agrárias e ambientais predatórias na fronteira de expansão das "commodities"; ignora também o direito constitucional de propriedade, naquilo que este tem de mais promissor: sua função social-ambiental.

Por seu turno, a Reforma Tributária oficial também nasce focada em dois retrovisores: golpeia os direitos sociais da Constituição de 1988, condição imprescindível para se fazer a defesa dos mais pobres na crise, e ignora ainda a crise econômica, pelos seus efeitos altamente desestabilizadores sobre as arrecadações tributárias. É tempo de mudar de agenda, sob pena de completo desgoverno sobre as condições críticas da economia e da sociedade.

Guilherme Costa Delgado é doutor em Economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

Fonte: Correio da Cidadania

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