terça-feira, 13 de outubro de 2009

Quatro mil crianças são retiradas do trabalho infantil

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por Leonardo Sakamoto


O governo federal anunciou que retirou do trabalho ilegal quatro mil crianças e adolescentes em todo o país através de ações de auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego apenas neste ano. Antes que alguém comece a insultar nossa inteligência dizendo que criança que pega no pesado cresce com caráter mais apurado, vale ressaltar que a Secretaria de Inspeção do Trabalho considera como ilegal “o trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de 18 e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos” – conforme o artigo 7º da Constituição.

Quem acompanha este blog sabe do que estou falando. Casos como os das crianças potiguares que abatiam gado e reviravam tripas de bois em matadouros no interior do Rio Grande do Norte ou dos jovens que colhiam limão e dormiam com ratos a menos de 100 quilômetros da capital paulista são uma vergonha para o país. Parte dos empresários, temendo repercussões negativas para a imagem de seus produtos e serviços, têm olhado para as suas cadeias produtivas com mais cuidado. Outros, com a certeza de que continuarão com seus mercados fazem de conta que não é com eles e usam justificativas como: “ah, mas na China e na Índia a situação é pior”. E a infância vai sendo tragada pelo ralo da economia.

Em 2008, o Brasil tinha 4,5 milhões de crianças e adolescentes trabalhando – um total 0,7% menor que no ano anterior, mas ainda assustadoramente alto. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgada recentemente. Diante disso, o trabalho dos auditores é louvável, mas ainda uma gota. Deveria vir acompanhada de ações mais contundentes de prevenção – educação básica de qualidade, presença de serviços públicos como saúde e saneamento, geração de emprego e renda decentes – caso contrário isso é apenas enxugar gelo. Isso sem contar com a punição para as cadeias produtivas que lucram com o trabalho infantil, o que ainda engatinha no país.

Tempos atrás, a Organização Internacional do Trabalho divulgou um estudo apontando que a maioria das 75 milhões de crianças sem acesso à educação básica no mundo começaram a trabalhar em idade precoce. Causa e efeito.

A OIT destaca que os altos índices de trabalho infantil estão diretamente associados à queda na qualidade da educação e à desigualdade de gênero em um país. Ou seja, compromete a sua capacidade de desenvolvimento econômico e social. Além disso, os meninos e meninas trabalhadores rurais tendem a estar entre os mais desfavorecidos. E (como era de se esperar de uma humanidade machista) as meninas com frequência têm uma carga dupla de trabalho dentro e fora de casa, o que atrapalha sua escolaridade. Na dúvida, a família manda o menino para estudar e deixa a menina com os afazeres domésticos. Segundo a OIT, entre 2000 e 2004, o número de crianças e adolescentes entre 5 e 14 anos economicamente ativos diminuiu em 20 milhões. Mas ainda restam 165 milhões na mesma faixa etária envolvidos em trabalho infantil, muitos em longas jornadas e expostos a condições insalubres.

Qual é a lição de casa para prevenir tudo isso é claro. O difícil é ver um governo implantá-la de forma universal e eficaz. Ao passo que, ao mesmo tempo, parte da classe trabalhadora que foi acostumada a ser explorada passou ela própria a justificar a sua exploração, repetindo o discurso que a ela foi reservado: só o trabalho liberta.

Pois até entendo que muita gente sinta que sua experiência de superação é bonita o suficiente para ser copiada pelo seu filho ou filha. Mas será que eles não imaginam que o trabalho infantil, que atrapalha o desenvolvimento da criança, não precisa ser hereditário?

Fonte: Blog do Sakamoto

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