sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Lendas urbanas sobre Honduras

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por Antonio Luiz Monteiro Coelho da Costa - na Carta Capital


O discurso de colunistas na mídia conservadora recorre a argumentos pseudojurídicos para defender o golpe hondurenho como uma “destituição legal”, praticamente os mesmos usados na mesma mídia para defender a ditadura militar em 1964. Convém repassá-los, por absurdos que sejam.

Zelaya queria manter-se indefinidamente no poder.
O presidente planejava uma consulta sobre a celebração de um referendo a respeito de uma Constituinte juntamente com a eleição de seu sucessor. Se o resultado da consulta fosse positivo, serviria apenas como argumento em favor do referendo ante o Legislativo. Se o Congresso cedesse e o resultado do referendo fosse positivo, a Constituinte seria eleita no próximo governo e, mesmo que aprovasse a reeleição, Zelaya só poderia se candidatar em 2014.

Zelaya incorreu no artigo 239 da Constituição de 1982, que cassa o mandato e os direitos políticos, por dez anos, de quem propor reeleição.
O presidente não incorreu no artigo 239. Não propôs reeleição e sim um referendo sobre uma ampla Constituinte. Já Micheletti, deputado em 1985, propôs expressamente uma reforma constitucional para prorrogar o mandato do então presidente Roberto Suazo. Desistiu por pressão dos militares, mas nem ele nem Suazo foram punidos.

A deposição de Zelaya foi legal e regular.
Pelo artigo 313 da Constituição, a Suprema Corte tem jurisdição para processar e julgar o presidente, mas se cabia processo por abuso de autoridade por tentar rea-lizar uma pesquisa de opinião sem autorização legal, teria de ser dentro de procedimentos legais com direito de defesa e contraditório (art. 82). Não foi assim: na madrugada do domingo da consulta, os militares invadiram o palácio e expatriaram o presidente, o que é expressamente proibido pela Constituição (art. 102). A ordem de prisão apareceu depois do fato consumado, embora o procurador-geral e um dos juízes da Corte alegassem tê-la emitido e aprovado em segredo, na sexta-feira. Se fosse regular, deveria ser executa-da pela polícia, depois das 6 da manhã.

Os processos por suposta corrupção contra o presidente e integrantes de sua equipe foram abertos depois da expulsão, sem possibilidade de defesa. Ao compactuarem com tais ilegalidades, Congresso e Corte cometeram violações da Constituição muito mais graves que Zelaya. Nenhum governo reconheceu o golpe como legal – nem mesmo EUA, Israel e Taiwan, apesar de manterem seus embaixadores.

A Suprema Corte de Honduras é isenta e apartidária.
Antes do golpe, a comissão de direitos humanos da OEA já criticava Honduras pela falta de um Judiciário “independente e eficaz”. Larry Birns, diretor do instituto Council on Hemispheric Affairs, a classifica como “uma das instituições mais corruptas da América Latina”.

A opinião pública hondurenha é contrária a Zelaya.
Pesquisa Gallup dias após o golpe (30 de junho a 4 de julho) mostrou que 46% dos hondurenhos tinham opinião favorável a Zelaya e 44% desfavorável. Micheletti tinha 30% a seu favor e 49% contra. Outro indício de popularidade é que quatro candidatos que apoiaram o golpe foram à embaixada brasileira e se fizeram fotografar abraçando o presidente.

O Congresso hondurenho ratificou a destituição.
O Legislativo hondurenho não tem jurisdição sobre o assunto: a Constituição não prevê o impeachment, e a própria Suprema Corte julgou, em 2003, que o Congresso não tem o poder de interpretar a Constituição.

Hospedar Zelaya deflagrou a violência em um país que estava tranquilo.
Até meados de agosto, o G-16 (dos países que prestam ajuda a Honduras) contava oficialmente sete mortos, dezenas de presos e torturados e centenas de feridos (inclusive à bala) pelo regime Micheletti, que o Comitê de Defesa dos Direitos Humanos responsabilizava por um total de 101 mortes e execuções extralegais durante toques de recolher. A CIDH da OEA recebeu informes de centenas de detenções irregulares e ameaças e agressões a juízes que deram habeas corpus a manifestantes e oposicionistas detidos pelo regime. A presença de Zelaya apenas chamou a atenção da mídia e da comunidade internacional para o problema e forçou a ditadura a negociar.

O Brasil expôs o território nacional à invasão de Honduras ao hospedar Zelaya.
A embaixada é parte do território do país- onde está localizado e não do país que representa, embora convenções internacionais resguardem sua imunidade de jurisdição, inclusive ante ações policiais e mandados de prisão.

Fonte: Carta Capital

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