Financial Times: De olho no Brasil. E na violência do Brasil
Brazil is the 21st-century power to watch
By Michael Skapinker, no Financial Times
Quando fui recentemente a uma conferência de jornalistas de publicações internacionais, o moderador pediu a nós que indicasse a grande notícia do ano que vem.
Um dos participantes sugeriu as eleições parlamentares britânicas. O segundo mencionou as contínuas ramificações da crise financeira. Eu disse o Brasil, que estava perto de visitar pela primeira vez.
Considerem, eu disse: o Brasil passou pela crise financeira em estado razoável. Estava sentado sobre vastas descobertas de petróleo em águas profundas. Tinha acabado de ver o maior lançamento de ações do mercado mundial este ano -- os 8 bilhões de dólares do braço brasileiro do Santander. Seria sede dos dois maiores eventos esportivos do mundo, a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 -- que o Rio de Janeiro venceu este mês ao bater Tóquio, Madrid e Chicago.
Ainda assim, quando eu estava em meu vôo rumo ao Rio, não pude suprimir minha ansiedade com um problema bem conhecido do país. "Violência e crime podem ocorrer em qualquer lugar e em geral envolve armas de fogo e outras armas", o escritório britânico de viagens adverte sobre o Brasil. "Casos de sequestros de automóveis ocorrem, algumas vezes com os ocupantes levados para sacar dinheiro de suas contas em caixas automáticos".
Quanto ao transporte público: "Há casos em que gangues incendeiam ônibus com os passageiros dentro depois de roubá-los", diz o escritório.
As recomendações oficiais são geralmente apavorantes. Se o pior acontecer, os governos não querem você dizendo que eles deveriam ter alertado.
Mas o velho conhecedor do Brasil, Peter Robb, não deu garantias. O Brasil é "um país de imensa riqueza natural, em paz com seus vizinhos e não enfrenta turbulência ou tensão social dentro de suas fronteiras. Apesar disso a taxa de homicídios do Brasil, dezenas de milhares de mortes violentas por ano, se enquadra nos parâmetros das Nações Unidas para uma guerra civil de baixa intensidade", ele escreveu em seu hipnótico livro "Uma morte no Brasil".
Não vi nada disso. Mas dois dias depois que parti, batalhas armadas entre gangues de drogas rivais do Rio custaram 14 vidas, inclusive as de três policiais mortos quando o helicóptero em que estavam foi derrubado.
Gente que vive em países de alta incidência de crime diz três coisas. Primeiro, que nada nunca aconteceu com elas nos países supostamente perigosos em que vivem, mas que foram assaltados em, vamos dizer, Londres. Segundo, que você deve apenas tomar as mesmas precauções que toma em casa. Terceiro, que a violência é contida dentro de certas áreas e consiste principalmente de criminosos que matam uns aos outros.
O primeiro argumento é bobagem. Naturalmente que há gente assaltada em Londres. Só que é muito menos comum. A segunda desculpa não vale: em casa, você sabe quais bairros são perigosos e quem pode causar problemas. Num lugar novo você não sabe e os bandidos podem sentir a sua hesitação.
O terceiro argumento é válido em alguns lugares, mas não no Brasil, onde a violência frequentemente se espalha para fora das favelas e onde os mais ricos temem por sua segurança.
É preciso dar crédito ao Brasil: durante vários dias de conversas e entrevistas no Rio e em São Paulo, nenhuma pessoa negou que o crime violento no país é real e poderia ter sério impacto no desenvolvimento, sem mencionar os dois eventos esportivos em que o país será vitrine.
Não se trata só de crime. As instalações ferroviárias, rodoviárias e os aeroportos requerem grandes investimentos. A vasta distância entre os ricos e pobres é imediatamente evidente.
Ainda assim o Brasil é um país de tremendo potencial, com um povo hospitaleiro e ricamente diverso, com comida excelente e companhias de classe mundial. Ao contrário da China, o Brasil não tem conflitos étnicos e é uma democracia multipartidária. Os brasileiros reclamam da corrupção de seus políticos mas dizem que, ao contrário das eleições presidenciais nos Estados Unidos, os resultados no Brasil -- a próxima eleição será em outubro de 2010 -- são anunciados rapidamente.
Extrair o petróleo recentemente encontrado, enterrado sob milhares de metros de água, pedra e sal, será um desafio. Mas as reservas oferecem a perspectiva intrigante de transformar o Brasil num grande exportador de petróleo ao mesmo tempo em que deriva a maior parte de sua própria eletricidade de hidrelétricas e abastece seus próprios carros com etanol de cana de açúcar.
Os brasileiros sabem que o petróleo pode ser uma maldição tanto quanto uma benção. Como será usada essa nova riqueza vai determinar se o país se tornará uma força do século 21.
O Brasil é um país emocionante de visitar. Em seu livro, Robb escreveu: "O Rio é grande e amável e aterrador. São Paulo é maior e mais aterradora e nem um pouco amável".
Ele está certo sobre a amabilidade do Rio -- a maratona olímpica vai ser um espetáculo televisivo. São Paulo, embora não amável, tem mais avenidas com sombras de jacarandás do que você espera.
O Brasil será uma grande notícia -- não apenas para o próximo ano, mas pelos anos seguintes.
Fonte: Vi o Mundo / Financial Times (pra acessar o site em inglês é só se registrar. É grátis)
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