por Luiz Carlos Azenha
Eu confesso que não entendi as declarações do presidente brasileiro sobre o culto a heróis. A quem ele se referia? Talvez o brasileiro seja muito debochado para se entregar a essa atividade. Sabemos que muitos heróis têm pés de barro.
No contexto em que as declarações foram feitas, no entanto, entendi a fala de Lula como um pedido para que se mude de foco no debate sobre tortura no Brasil: passaríamos dos algozes às vítimas.
É uma pena que Lula não tenha se manifestado com clareza a respeito deste assunto. As declarações dele servem muito mais para confundir do que para esclarecer.
Os militares costumam dizer que punir os torturadores e não os guerrilheiros que lutaram contra o regime militar seria injusto. Essa confusão serve aos que querem turvar a água e matar o debate. Existe uma diferença clara entre torturadores e torturados, seja qual for a acusação que se possa fazer contra os presos. Os torturadores eram agentes do estado. E nenhum estado pode admitir a tortura, sob pena de ter a sua própria legitimidade questionada.
O ponto central é este: o estado brasileiro torturou. Deve admitir essa culpa. E pagar por isso. O estado brasileiro deve ler o livro The Dark Side, da jornalista Jane Mayer, que mostra como a tortura aplicada pelos Estados Unidos na luta contra o terrorismo é contraproducente e enfraquece politicamente o país. O estado brasileiro deve combater e extingüir a tortura em delegacias de polícia.
Estou entre os que acreditam que politizar o debate sobre tortura não leva a lugar algum. Não me interessa se o governo do PT é a favor ou o governo do PSDB é contra. Interessa, sim, que o Estado brasileiro reconheça que torturou e que todas as consequências disso sejam contempladas dentro do Judiciário. Apesar do Gilmar Mendes. Ele parece mandar no STF, mas não na Justiça.
Que se abram todos os arquivos. Informação não faz mal a ninguém. Aliás, faz sim. Caso contrário não haveria essa briga para controlá-la.
A fala de Lula, segundo a Reuters:
Lula defende culto a 'heróis' e não incriminação de 'vilões'
REUTERS
RIO DE JANEIRO - Após decretar o fim da polêmica no governo sobre a revisão da Lei de Anistia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu nesta terça-feira que a sociedade aprenda a cultuar seus "heróis" e não busque apenas incriminar os "vilões" da história.
Segundo Lula, os brasileiros têm dificuldade em valorizar os seus mortos e disse que o último herói para o povo brasileiro foi Tiradentes.
"Nós precisamos tratar um pouco melhor os nossos mortos... Toda vez que nós falamos dos estudantes que morreram, dos operários que morreram, nós falamos xingando alguém que os matou, quando na verdade esse martírio nunca vai acabar se a gente não aprender a transformar os nossos mortos em heróis e não em vítimas", disse Lula.
A declaração foi feita em discurso durante assinatura de mensagem de projeto de lei que prevê a reconstrução do prédio da União Nacional dos Estudantes, incendiada durante a ditadura militar, em 1980.
Os ministros da Justiça, Tarso Genro, e dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, defenderam recentemente que a Lei da Anistia não deveria valer para torturadores. Alegam que a tortura não é crime político, perdoado pela anistia, e sim crime hediondo. Na segunda-feira, Lula determinou que os ministros fiquem fora desse debate, que deve ser conduzido pelo Judiciário.
"Imagina se a Frente Sandinista ficasse lamentando todos que Somoza matou. Imagine se Fidel (Castro) ficasse lamentando todos que Batista matou. Não! É fazer com que essas pessoas que tombaram lutando por alguma coisa em que acreditavam se transformem em heróis, que sejam símbolos da nossa luta. Que na sede da UNE tenha a fotografia e a história dos que morerram", defendeu Lula, sob aplausos discretos dos estudantes.
Fonte: Vi o Mundo
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