quinta-feira, 28 de agosto de 2008

ÍNDIO NÃO CONSOME E QUEM NÃO CONSOME NÃO É GENTE

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por Luiz Carlos Azenha

Índio não compra jornal. Índio não compra anúncio na televisão. Índio não compra propaganda na rádio. Índio não vota. Índio não patrocina campanha eleitoral. Índio não consome. Não consumir dá nisso: você não vale nada numa sociedade como a brasileira.

Isso ajuda explicar o motivo pelo qual índio está f..... na mídia.

Querem um exemplo? Desde que a disputa por terra na Raposa Serra do Sol começou, nos anos 80, 21 indígenas foram mortos. Sobre quantos casos você ouviu falar no rádio, na televisão, nos jornais?

Por outro lado, quantas vezes a mídia corporativa brasileira abriu espaço para falar do perigo dos "índios imperialistas", que manipulados por estrangeiros vão retalhar o Brasil?

Fiquem com a transcrição aproximada da entrevista que fiz com a advogada Joênia Wapixana, que representa os indígenas no Supremo Tribunal Federal.

A entrevista foi feita em Boa Vista, Roraima.

Fiquem tranqüilos que a Joênia não vai aparecer nas páginas amarelas da Veja:

O Paulo Quartiero, em uma entrevista que a gente gravou com ele, falou que aqui na região o desenvolvimento se dará da mesma forma que em outras regiões do Brasil e não tem como mudar isso...

Olha, essa palavra desenvolvimento para nós tem outro significado que o meramente capitalista, meramente econômico e individual. O desenvolvimento que trabalhamos é numa perspectiva de respeito. Primeiro, ao próprio costume e à própria cultura indígena. Para mim, desenvolvimento é você ter água com qualidade e você manter um ambiente saudável, ter saúde, educação. O desenvolvimento que se prega é muito diferente dos valores indígenas. É lógico que nós usamos tecnologia para benefício próprio. Mas o desenvolvimento dos arrozeiros é puramente individual e nele só tem importância a cobiça, a ganância e a exploração dos recursos naturais. Os rios Surumu, Tacutu e Cotingo são os principais rios que abastecem as comunidades [da reserva]. É onde se toma banho, de onde se consome para afazeres domésticos, onde tem os peixes. É a principal fonte de sobrevivência da biodiversidade. Qual é o tratamento que se dá a esses rios? Eles tiram água para a irrigação, desviam o curso do rio através de valas e não há qualquer controle sobre a utilização. Há quantos anos eles fazem isso? O que se faz ali na plantação de arroz é a pulverização, que contamina as águas! Com o que? Com agrotóxicos. O desenvolvimento que ele [arrozeiro] trouxe para Roraima é o que destrói, o que degrada, que ocupa ilegalmente terra de comunidades que têm direitos coletivos. Então queremos um desenvolvimento onde as comunidades indígenas tenham suas criações conforme os manejos tradicionais, onde tudo é discutido coletivamente, onde há respeito ao meio ambiente, onde ninguém sai jogando agrotóxico. A gente utiliza tecnologia nos cursos de preparação para lidar com reflorestamento -- por exemplo, de buritizais, de madeira -- mas para as próprias comunidades indígenas. Essa é a nossa forma de desenvolvimento, que contribui com o meio ambiente, não que acabe com ele. Desenvolvimento, sim, mas com respeito, não de qualquer jeito.

Foi feito um estudo de impacto ambiental para retirar a água dos rios e irrigar as plantações de arroz?

Claro que não, eles nem sequer têm licença do Ibama, conseguiram uma licença ilegal dada por um órgão estadual. Judicialmente nós cobramos uma posição dos órgãos fiscalizadores. Inclusive duas semanas atrás eles foram multados em 30 milhões de reais, uma multa que inclui não só retirada de água mas por terem fechado [aterrado] um lago. Acho que inclui aquelas bombas, que foram lacradas.

Mas as bombas estão funcionando, a gente viu...

Pois é, mas é justamente isso que a gente não entende. O Supremo suspendeu a retirada dos arrozeiros e de outros não-índios mas não deveria fechar os olhos para os crimes que são cometidos dentro da terra indígena.

(SEGUE...)

Fonte: Vi o Mundo

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