quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Obama faz-se de cego ante o apartheid em Israel

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do blog do Bourdoukan

(por Bruce Dixon, in Al-Jazeera, 31/07/2008 11:30:00 PM GMT, em http://www.aljazeera.com/news/newsfull.php?newid=143865)

A campanha presidencial de Democratas e Republicanos trata menos de oferecer discussão ao público norte-americano, do que compete por espaço para divulgar novos modelos de carros ou de água engarrafada, divulgação esta que tampouco tem algo a ver com ‘fatos’.

Trazida a campanha presidencial até o público pelos mesmos marqueteiros das mesmas corporações que nos vendem estilos de vida e cerveja, as campanhas presidenciais visam a estabelecer e explorar a ‘fidelização’ visceral, à prova de fatos e de bom-senso, dos ‘clientes’, à marca de um partido ou de um candidato.

A natureza à prova de fatos da marca “Obama” e o que a mídia corporativa é capaz de fazer para proteger a marca tornaram-se completamente visíveis durante a breve visita que o candidato fez a Israel e Palestina, há alguns dias.

O rosto moreno e sorridente de Barack Obama e a linhagem Kansas-Kenya são elementos essenciais da marca Obama, imagem nebulosamente progressista, de transformação pós-racial em casa e em todo o planeta, que é o segredo do sucesso e do appeal da marca. Ao mesmo tempo, Barack Obama obedece o compromisso de preservar o que ele chama de identidade de “Israel como Estado judeu”, terminologia polida para designar o que o resto do mundo já sabe que é um Estado de apartheid.

Editorial de 29/6, assinado por ninguém menos que o editor do principal jornal de Israel, Ha'aretz, Amos Schocken, exibia, em manchete o seguinte título: “Lei da Cidadania faz de Israel um Estado de apartheid”. O editorial denunciava o governo de Israel que proíbe que se reconheçam casamentos (“associações familiares”) entre árabes que tenham cidadania israelense e árabes que vivam nos bantustões de Gaza e da Cisjordânia – nos territórios palestinos ocupados – e que não tenham cidadania israelense.

“A lei declara que o ministro do Interior não tem autoridade para conceder visto de residência em Israel para os residentes em Judéia e Samaria (a menos, é claro, que sejam judeus, isto é, colonos ocupantes). A lei proíbe explicitamente associações familiares (quer dizer, casamentos), nos casos em que o cidadão palestino que deseje casar tenha menos de 35 anos (homens) ou 25 (mulheres). De fato, a lei impede que israelenses jovens casem com quem desejem casar e vivam com o cônjuge escolhido em Israel, se o cônjuge for palestino da Judéia ou de Samaria (que são os nomes que Israel usa para designar os Territórios Ocupados da Cisjordânia e Gaza).

Obviamente, a lei não terá efeito algum no direito de os judeus israelenses jovens viverem com seus cônjuges escolhidos no território israelense, porque não há casamentos entre israelenses e palestinos dos Territórios Ocupados da Cisjordânia e Gaza. Por outro lado, a população palestina é o grupo natural no qual os árabes israelenses escolhem marido e esposa. Por isto, a lei discrimina severamente, ao criar direitos diferentes para os jovens cidadãos judeu-israelenses e os jovens cidadãos árabe-israelenses.”

Os correspondentes da “Big Media”, que cobrem incansavelmente os movimentos de Obama em casa e pelo planeta, não são idiotas ou ignorantes. Todos eles lêem diariamente o jornal Ha'aretz; todos conhecem o apartheid israelense. Todos são profissionais eficientes, todos conhecem seu trabalho e os limites do que fazem.

Todos aqueles jornalistas sabem perfeitamente que seria assinar o fim da própria carreira profissional perguntar, direta ou indiretamente, àquele orgulhoso filho de pai africano negro e de mãe norte-americana branca, que é cidadão norte-americano porque esta cidadania lhe é assegurada pela mãe, e basta que pai ou mãe sejam norte-americanos para que o filho também o seja... como é possível que ele (ele!) apóie sem criticar um Estado de apartheid, como é o Estado de Israel.

Afinal, o Estado de apartheid em Israel dá ou nega direitos de cidadania por critérios étnicos e religiosos; considera critérios de propriedade; considera nível educacional; nega o direito de viver onde alguns cidadãos desejem viver; distribui diferentes placas de veículos (o que permite que a polícia identifique à distância os diferentes cidadãos); impede o acesso de palestinos às fontes de água e de energia elétrica; impõe pontos de controle só para palestinos; e mantém estradas reservadas só para judeus.

É erro, portanto, supor que o rabo israelense esteja sacudindo cachorro, no caso dos candidatos e da “Big Media”. O Estado de Israel, militarizado e nuclear, depende integralmente da ajuda dos EUA, de apoio econômico e de apadrinhamento político. Mais de seis bilhões de dólares dos contribuintes norte-americanos vão diretamente para Israel, a cada ano.

Israel não poderia dar andamento à sua brutal política de anexação, à construção dos muros, à ocupação de terras palestinas, nem poderia implantar qualquer outra de suas políticas, por piores que sejam, sem o completo apoio dos círculos de poder dos EUA. Para os EUA, Israel é um enclave branco armado com armamento nuclear, implantado em território no qual vivem milhões de seres humanos amorenados que vivem sobre o maior depósito de petróleo acessível que há no planeta.

O apartheid na África do Sul foi odioso, sim. Mas o apartheid na África do Sul não foi estratégia política básica, ou economicamente decisiva, para os EUA. O apartheid em Israel é.

A opinião pública nos EUA, como no resto do mundo, persistentemente exige que os EUA adotem políticas mais justas para a Palestina. Mas as corporações de mídia e a elite política dos EUA – Obama também, é claro – não ouvem a opinião pública. Quanto a isto, como escreveu Glen Greenwald, de Salon, “a opinião pública não conta”.

Se, como dizem alguns apoiadores de Obama, há um “movimento” ao qual Obama é sensível, e que potencialmente influenciaria sua posição, é mais do que hora para que o tal “movimento” apareça e faça-se ouvir.

Se não aparecer, porque não pode ou porque não quer, aí estará boa prova de que a candidatura de Obama é tão ‘à prova de povo’ quanto qualquer outra candidatura apoiada pela corporação da “Big Mídia”; de que não há e jamais houve qualquer “movimento-Obama” realmente transformador; e que depois de novembro, Obama aparecerá como o que é: mais outra marca de mercado; como Monsanto, ou Ford, ou Exxon.

Bruce Dixon is Managing Editor of the Black Agenda Report (BAR). He is based in Atlanta and can be reached at bruce.dixon@blackagendareport.com

Fonte: Blog do Bourdoukan

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