domingo, 23 de novembro de 2008

DIREITOS HUMANOS: o significado da renúncia de Baltasar Garzón.

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foto: O magistrado espanhol Baltasar Garzón


por Wálter Fanganiello Maierovitch

O magistrado espanhol Baltasar Garzón atua, na Espanha, como juiz de instrução. Lá não existe a figura do inquérito policial, que í invenção brasileira. Cabe a um juiz-instrutor espanhol comandar a investigação voltada a apurar a existência de crime e a sua autoria. O Brasil, --como se nota da leitura da Exposição de Motivos (uma das fontes de interpretação da lei processual) ao Código de Processo Penal--, optou pelo sistema do inquérito como ato de polícia judiciária e, “pela extensão territorial”, não adotou o juizado de instrução.

Na Espanha, como um dos juízes de instrução, coube a Garzón a abertura de um procedimento investigatório sobre os 114 mil desaparecidos durante a Guerra Civil Espanhola e os primeiros 12 anos da ditadura do general Franco.

Garzón conseguiu identificar, em 20 províncias espanholas, fossas coletivas onde eram sepultadas as vítimas da resistência ao terror franquista.

A Procuradoria Nacional da Justiça da Espanha, de forma igual à canhestra posição da nossa Advocacia Geral da União, entende ser legítima e constitucional a Lei de Anistia espanhola, que é de 1979 e sancionada três anos depois da morte de Franco.

Para Baltasar Garzón, -- com todo acerto--, os crimes contra a humanidade não prescrevem e não podem ser anistiados. Frise-se: a posição de Garzón, que encontra apoio no direito natural positivista e nas convenções e tratados internacionais, é diversa do brasileiro Antonio Carlos Tóffoli, advogado geral da União.

Quando a Procuradoria Nacional cogitou de levar a discussão da Lei de Anistia para a chamada Sala Penal das Audiências de interesse Nacional e isto para arquivar o procedimento aberto por Grazón e afstá-lo de qualquer investigação sobre matéria alcançada pela Lei de Anistia espanhola, Garzón deu um toque de mestre.

Com efeito. Garzón concluiu um relatório sobre suas apurações. O relatório Garzón tem 152 páginas e revela, pelo território espanhol, os locais onde estão 20 “fossas coletivas” com corpos das vítimas. Além do relatório, ele constituiu uma comissão de peritos para iniciarem o trabalhos de exumações e identificações dos corpos.

Como Garzón percebeu que poderia ocorrer arquivamento do procedimento que tocava e o conseqüente afastamento seu do caso, adotou três medidas que a supracitada Sala Penal de Audiência Nacional não poderá cassar. Ou melhor, Garzón esvaziou a decisão da Sala Penal de Audiência Nacional.

A primeira medida foi encaminhar ao governo Zapateiro, para prosseguimento em sede administrativa e não mais Judiciária, dos trabalhos da Comissão de Peritos. Trabalhos, ressalte-se mais uma vez, voltados à exumação e identificação dos corpos enterrados nos 20 sítios identificados. E isso a ministra da Justiça de Zapateiro irá realizar, pois o governo tem compromisso de resgatar a memória histórica da Espanha.

A segunda deliberação de Garzón foi a de desmembrar o procedimento de apuração, enviando para as autoridades das 20 províncias onde se encontram as fossas com os desaparecidos. Cada província tem autonomia administrativa para prosseguir nas apurações.

Como última deliberação, e já com tudo encaminhado, Garzón renunciou a prosseguir no caso, para evitar o seu afastamento.

Neste final de semana, Garzón receberá apoio de vários intelectuais e artistas de importância no cenário internacional, que assinarão um manifesto a ser lido no início da próxima semana. Dentre os intelectuais e artistas assinarão o manifesto José Saramago, Ernesto Sábato, Jose Luis Sampedro, Juan Goytisolo, etc.

PANO RÁPIDO. Com essa supracitada atitude, Garzón demonstrou que não busca, como foi acusado, promoção pessoal, mas o resgate à verdade histórica e o compromisso de defesa com os direitos do ser humano.

Fonte: Blog do Wálter Fanganiello Maierovitch

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