terça-feira, 25 de novembro de 2008

Democracia passa por acesso à terra e mudança do modelo agrícola

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X REAF DO MERCOSUL

Democracia passa por acesso à terra e mudança do modelo agrícola

Reunidos na X Reaf, representantes dos governos e de organizações da sociedade civil dos países do Mercosul pedem o fortalecimento da agricultura familiar na América Latina. Presidente do Incra afirma que implementação de novos modelos é prioridade da reforma agrária no Brasil.

RIO DE JANEIRO – O resgate da função social da terra, a busca por um modelo sustentável de produção e a necessidade de adoção de políticas públicas que permitam a efetiva democratização do acesso à terra nos países da América Latina estão entre os temas mais debatidos da X Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do Mercosul (Reaf), que acontece até 27 de novembro no Hotel Guanabara, no Rio de Janeiro. Na segunda-feira (24), foram realizados dois seminários que reuniram representantes dos governos ou de organizações da sociedade civil de Brasil, Argentina, Bolívia, Venezuela, Paraguai, Uruguai, Chile e México (convidado).

Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, em entrevista exclusiva à Carta Maior, comemorou a realização da X Reaf: “Esse encontro é muito importante porque traz o tema da reforma agrária e do acesso à terra na América Latina e no âmbito do Mercosul. Isso é muito importante neste momento em que nós vivemos várias crises mundiais: de energia, de alimentos, a crise financeira do capital. O acesso à terra é uma das condições para o desenvolvimento da América Latina”, disse.

Hackbart afirmou que o fortalecimento da agricultura familiar é tarefa fundamental para garantir o desenvolvimento sustentável dos países do Mercosul: “No Brasil, eu não tenho dúvida, a única saída para o país é desenvolver o mercado interno. De que maneira? Desenvolvendo o meio rural e distribuindo terra, crédito e assistência técnica como uma das formas de as pessoas não virem todas para os grandes centros urbanos”, disse.

A crise econômica, segundo o presidente do Incra, deve intensificar a luta pela terra: “No Brasil, os interesses pela terra aumentam muito e, na minha opinião, isso vai continuar. O grande desafio que temos no Incra é saber quais valores públicos devemos percorrer, devemos buscar. No nosso entendimento, o acesso à terra é um deles. A viabilização dos assentamentos rurais é outro. Apesar de todas as adversidades que encontramos na legislação e no Poder Judiciário, nós vamos percorrer esse caminho, sempre tendo presente que nosso principal objetivo é a mudança do modelo de agricultura em nosso país”.

Essa mudança passa pelo combate ao modelo erigido pelo agronegócio: “Uma das metas centrais da reforma agrária hoje no Brasil é conseguir implantar nos assentamentos novos modelos de agricultura que não sejam baseados na monocultura, no veneno, na produção de alimentos sujos, na destruição do meio ambiente e na concentração da terra. Acho que esse pode ser uma luta que nos una na Reaf, tanto do ponto de vista governamental quanto do ponto de vista dos movimentos sociais”, disse Hackbart.

A Reaf, no que depender da vontade do governo brasileiro, será o pólo irradiador do fortalecimento de um modelo baseado na agricultura familiar em todo o continente: “Estamos discutindo o acesso à terra, a adoção de políticas públicas para as mulheres e o gerenciamento de risco para a agricultura familiar. Acho esta última discussão muito importante, já que este modelo do agronegócio é dominante. Neste momento, e enquanto ele não for mudado, devemos pensar em como garantir segurança para a produção da agricultura familiar e da reforma agrária”, disse o presidente do Incra.

Pontos em comum

Rolf Hackbart disse que os pontos em comum entre os países latino-americanos, sobretudo aqueles que integram o Mercosul, são grandes: “As situações são muito parecidas em termos de legislação, mas, principalmente, do ponto de vista econômico. É o mesmo modelo de agricultura que concentra a propriedade, que expulsa o trabalhador da terra, que produz com veneno. É isso que nós precisamos mudar. É preciso garantir renda para a produção de alimentos limpos e garantir o acesso à terra. Essa é a principal função do Incra”, disse.

Hackbart fez um balanço positivo da trajetória da Reaf, que se reuniu pela primeira vez em 2004: “A principal evolução até aqui é o fortalecimento dos movimentos sociais, o que não é uma coisa fácil. Os movimentos estão se falando, estão se reunindo entre países há décadas para identificar pontos em comum. Aos poucos, os governos progressistas da América Latina começam a trocar experiências e a fechar convênios numa mesma linha de fortalecimento da organização social e de mudança do modelo agrícola”.

Dois seminários

Na segunda-feira (24) foram realizados os dois primeiros seminários previstos na X Reaf. Um deles teve o tema “Função Social da Terra – Concentração, Estrangeirização e Uso da Terra”, e reuniu à mesa de debates representantes de Brasil, Paraguai, Uruguai e Chile. O outro seminário teve como tema “Gestão de Risco no Contexto da Segurança Alimentar e o Desafio das Mudanças Climáticas”, e, em seus debates, contou também com a participação de um representante mexicano.

Secretário de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Adoniram Sanches afirmou que os pequenos agricultores, que respondem por 60% da produção dos alimentos consumidos na América do Sul, são os mais vulneráveis às mudanças climáticas: “É importante que haja um conjunto de políticas de seguro agrícola para que o agricultor atingido por esses eventos possa se precaver e evitar prejuízos a sua produção”, disse.

Fonte: Agência Carta Maior

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