segunda-feira, 20 de outubro de 2008

EVALDO NOVELINI SOBRE CONTARDO CALIGARIS

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por Evaldo Novelini, no Alfarrábios

Acho que vocês já estão cansados de saber a minha opinião sobre a Folha de S. Paulo.

Vejo-a como um dos jornais mais hipócritas do Brasil.

Pelo barulho que se tem feito, também desconfio que vocês já saibam que Marta Suplicy, candidata do PT à Prefeitura de São Paulo, vem sendo acusada de ser preconceituosa.

Tudo por conta deste vídeo aqui. Trata-se de uma inserção da campanha de Marta nas emissoras de televisão de São Paulo, onde um interlocutor procura instigar o eleitor a pesquisar sobre o passado do adversário da petista, o atual prefeito Gilberto Kassab, demo-tucano.

Baseados nas duas últimas questões do comercial - "É casado? Tem filhos?" -, a mídia dita grande e alguns dos mais renomados colunistas enxergaram um ataque subliminar à opção sexual de Kassab.

É corrente no meio jornalístico a insinuação de que Kassab é gay.

Ele nega, conforme pode ser lido aqui, no sítio virtual de O Globo.

A vida sexual de Kassab é o que menos importa para estes Alfarrábios.

O mesmo não se pode dizer da hipocrisia que grassa na mídia. Tal assunto mexe com os nossos brios.

Causa engulho saber que os figurões que hoje demonizam Marta Suplicy por ela ter, supostamente, atacado a vida pessoal de Kassab são os mesmos que, em passado recente, defendiam o direito de o eleitor saber se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, petista como a candidata a prefeita paulistana, havia ou não obrigado uma de suas namoradas a praticar aborto.

O ataque foi desferido na campanha eleitoral para a presidência da República, em 1989, pelo adversário de Lula, Fernando Collor de Mello. (Veja aqui o famigerado vídeo)

O Globo, vocês se lembram, né?, chegou a publicar o editorial "O direito de saber", apoiando a estratégia de Collor de Mello. (Leia aqui o famigerado texto, compartilhado do blog Vi o mundo, de Luiz Carlos Azenha)

Leia aqui, no sítio virtual Vermelho, ligado ao Partido Comunista do Brasil, que a mídia explora as questões pessoais de Marta desde 2001.

Mas voltemos à cobertura feita pela Folha sobre o caso.

Na edição de hoje, um de seus principais articulistas, o psicanalista Contardo Calligaris, aborda o assunto.

No artigo "Marta com McCain", Calligaris pega pesado com a "perua", como a revista Veja convencionou-a chamar.

A propósito, leia aqui, no sítio da própria publicação, porque a maior semanal do Brasil chama Marta de "perua".

Calligaris compara a propaganda da candidata àquela movida pelo nazismo contra os judeus. Para quem duvida (e é assinante da Folha), a íntegra está aqui.

Começa assim:

AS CAMPANHAS ELEITORAIS são facilmente sórdidas. Claro, os candidatos mentem inchando seus feitos, omitindo suas inércias, atribuindo-se realizações que são de outros ou dos predecessores. Mas isso dá para agüentar, é quase normal. Muito mais humilhante (para a gente) é quando as campanhas fazem apelo ao que há de pior em nós, ou seja, quando, na tentativa de desacreditar o candidato adversário, elas apostam em nossos preconceitos.

Lendo seu artigo, ou parte dele, é fácil concluir que Calligaris deve ser contra a prática de explorar as questões pessoais em uma campanha eleitoral, certo?

Nem tanto.

Alfarrábios pesquisou em seu vasto arquivo e encontrou uma edição antiga, mas nem tão antiga assim, da revista Imprensa, editada em São Paulo.

Na edição de agosto da revista, podia-se ler na capa:

- Entrevista: Contardo Calligaris, o psicanalista contra o óbvio.

Peço que os leitores desconsiderem o fato de o psicanalista que se diz contra o óbvio ter abordado o assunto que pauta 10 entre 10 articulistas políticos no momento, abordando-o exatamente sob o mesmo enfoque dos colegas.

No momento, dêem importância apenas a um trecho da conversa de Calligaris com o repórter Rodrigo Manzano, de Imprensa. São duas perguntas e duas respostas. Reparem nos trechos em itálico:

Como você avalia a questão da privacidade, nesse momento em que estamos todos expostos a virar notícia por alguma razão?

Ninguém tem o direito a um certo tipo de invasão de privacidade. Digo isso porque aparentemente grampear telefone se tornou um esporte nacional. Independentemente dessas questões específicas, esse é um problema complicado. Nos Estados Unidos, ninguém pára a vida privada de um político. Não estamos falando apenas da divulgação do imposto de renda, mas inclusive com quem ele transa. Isso interessa a todos a partir do momento em que é candidato.

Você concorda com essa lógica?

Eu concordo. Muito freqüentemente o apelo à qualidade moral da personalidade é crucial nas campanhas políticas. Nesse sentido, acho relevante saber se o cara transa com o ascensorista no 17º andar.

Se Calligaris, psicanalista dos mais renomados, com consultório nos Jardins, bairro nobre da capital paulista, não tiver assunto para abordar na próxima coluna, sugiro um:

- Hipocrisia.

Fonte: Vi o Mundo

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